A carência é uma forma sofisticada de chantagem
A carência, quando se converte em chantagem, não é mais vulnerabilidade. É poder. E o amor não sobrevive onde há poder travestido de fragilidade.
Poucas palavras carregam tanto afeto e ambivalência quanto "carência". Na superfície, ela parece legítima: todos têm direito ao afeto, ao cuidado, à escuta. Quem não sente falta de colo? Quem não deseja ser querido, ser importante para alguém? A carência aparece, assim, como uma necessidade afetiva, um pedido humano por conexão. Mas sob esse verniz emocional, há uma estrutura muito mais complexa — e muitas vezes perversa — que se esconde. Porque a carência, em muitos casos, não é um afeto genuíno: é uma estratégia de vínculo. Uma linguagem codificada. Um script psíquico de manipulação relacional. E, quando sustentada por tempo demais, ela se transforma numa forma sofisticada — e socialmente aceita — de chantagem emocional.
Essa afirmação, claro, fere. Porque coloca sob suspeita um dos sentimentos mais naturalizados do nosso vocabulário afetivo. Mas é precisamente por isso que ela precisa ser dita. A carência é, muitas vezes, um desejo disfarçado de necessidade. Uma exigência que se oculta sob a roupagem da fragilidade. Uma cobrança projetada como lamento. “Eu sinto sua falta” muitas vezes quer dizer “você me deve sua presença”. “Eu só queria um pouco mais de atenção” pode significar “sinto raiva por você não me priorizar como eu gostaria”. A carência, quando se fixa, deixa de ser expressão e se torna demanda. E toda demanda fixa é um modo de capturar o outro.
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