Há infâncias que não se medem por brinquedos ou escolas, mas por silêncios. Há filhos que crescem na penumbra afetiva de mães deprimidas, onde o amor não cessa, mas muda de forma — torna-se um campo de tensão sutil, um pacto silencioso de sobrevivência afetiva. Nessa configuração, o cuidado é invertido: a criança, ainda antes de ter linguagem, torna-se guardiã do humor materno. Aprende a pisar leve, a medir palavras, a modular gestos. O amor não desaparece — mas vem revestido de peso.
A clínica conhece bem esse cenário. São sujeitos que, na vida adulta, não sabem pedir. Não suportam incomodar. Vivem atravessados por uma culpa basal que não sabem nomear. Foram crianças que, para não sobrecarregar ainda mais uma mãe já em ruína, decidiram — sem decidir — que o melhor a fazer era sumir um pouco. Tornaram-se silenciosas, prestativas, sorridentes quando necessário, quase invisíveis. Como se dissessem: “eu não quero ser mais uma dor para ela”.
Esse movimento funda uma subjetividade invertida: o filho cuida da mãe, mesmo que inconscientemente. É ele quem a consola, a distrai, a impede de afundar. E nisso se forma o pacto: eu fico bem para que você não piore. A infância, então, torna-se um teatro de estabilidade, onde a criança interpreta o papel de equilíbrio psíquico da casa. Uma performance que tem alto custo psíquico: para sustentar a mãe, a criança renuncia a si.
Continue a ler com uma experiência gratuita de 7 dias
Subscreva a Torresmo para continuar a ler este post e obtenha 7 dias de acesso gratuito ao arquivo completo de posts.